terça-feira, 16 de junho de 2015

Madrid, escolhida por mim.

Madrid pode ser enorme. Pode ser uma estranha, destas desconhecidas que nunca te deixarão indiferente mas que realmente nunca chegas a perceber as suas entranhas, os seus segredos, os seus recantos. Visitá-la, não é o mesmo que viver com ela. Todos os dias.

Desde que vivo aqui, é normal ouvir dizer que ou te adaptas ou então, com o tempo, a cidade conseguirá comer-te e, eventualmente, quererás voltar para o sítio de onde vieste. Não podia estar mais de acordo.

Podes-te perder no meio de um ritmo tão rápido. Num ritmo que te assusta porque acaba por ser o teu próprio ritmo, sem que te dês conta, como se sempre tivesse sido assim. E nem tinhas pressa para chegar a lado nenhum. Percebes que o café é mau, e que dizer que o café é mau se transforma num cliché. No princípio os carros assustam. São demasiados. E perguntas-te porque continuas a tomar um café mau, numa esplanada rodeada de carros, um café mau e caro. Acabas por habituar-te ao pingo, com leite. Porque precisas de café e sabes que, a partir de agora, jamais poderás prescindir do leite.

E no Inverno tens frio - acabaram-se as camadas, as golas altas e os casaquinhos próprios para os 10 graus de Inverno no Porto. Aprendes que um bom casaco é o investimento da estação. Porque em todos os outros sítios, que não sejam ao ar livre, o calor é infernal.
E no Verão tens calor. Mas aprendes que a cadeira do teu escritório tem que ser o apoio de um casaco que lutará, contigo, contra o ar condicionado. E há uma echarpe que te acompanhará a todos os outros sítios carregados de diferenças de temperatura que não imaginavas que o teu corpo pudesse aguentar. "As grandes diferenças de temperatura fazem com que fiques doente." - afinal não. Mas além de tudo isto, aprendes que tens que saber escolher quem se senta ao teu lado, em frente a ti e do outro lado no escritório. Esses serão os teus melhores amigos na luta contra o aquecimento no Inverno e o ar condicionado no Verão.

Acabas por perceber que tens duas opções. Diferenciar o sítio em que viveste e o sítio em que vives. Pensar nos dois forma separada. Um, já foi a tua casa. O outro é a tua casa. Um foi o escolhido para que nascesses, para que te transformasses no que és hoje. O outro foi, foi o que tu escolheste depois de te transformares no que és hoje.
Há quem diga que a cidade te escolhe. Que não és tu que escolhes a cidade em que vives. Isso não poderia estar mais errado. Não podes deixar que Madrid te escolha. Porque te vais embora. Tens que ser mais teimoso e, todos os dias, um bocadinho maior.

Sim, Madrid é enorme. Diferente. Mas agora, um bocadinho minha. E aqui, tudo é o que parece ser. Ainda que, por vezes, teimemos que as aparências enganam. Que sigamos pela vida e pensemos que as coisas mudam e que mudam porque sim, aqui não. Se és um idiota, aqui, acabas por comportar-te como tal. Se te sentes sozinho, e não sabes explicar, acabarás por voltar para o sítio de onde vieste. Se não a cidade conseguirá comer-te. Lembras-te? Porque aqui podes avançar ao mesmo tempo que retrocedes em cada passo que dás.

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